Entrevista: Padre Sérgio Leal

Graças à internet, que torna este mundo na aldeia global, tive o privilégio de poder trocar algumas palavras com o Padre Sérgio Leal, anterior pároco nas Freguesias de Arrifana, Sanfins e Romariz. O Padre Sérgio Leal encontra-se actualmente a estudar em Roma por indicação do recentemente falecido Bispo D. António Francisco dos Santos. Mas antes de seguir nesta missão tive a oportunidade e felicidade de me cruzar com ele enquanto pároco na freguesia de Arrifana no período em que lá vivi. Trata-se de um padre ainda muito jovem, mas senhor de uma presença já capaz de abraçar e chamar a si a atenção dos seus paroquianos. E em três pequenos episódios tocou a minha vida de uma forma marcante e que despertou a minha atenção para a sua visão abrangente e moderna criando um contraste com a forma como até então eu via a religião e a Igreja. Vi nele um padre à imagem do actual Papa Francisco e da sua ideologia de uma Igreja que abraça todos e caminha com todos. Um rumo que eu acredito que a Igreja precisa de seguir. Não sei qual será a ideia que o novo Bispo para a nossa Diocese trará para o Padre Sérgio e para os outros padres que com ele se encontram em Roma a estudar, mas acredito que devia seguir o rumo traçado pelo anterior Bispo pois acredito ser o caminho certo para seguir e acredito que este teve muito mérito nos homens que escolheu para esta missão. Que não seja esta oportunidade desperdiçada.

Nome: Sérgio Filipe Pinho Leal
Data de Nascimento: 09/09/1985
Data de Ordenação: 08/07/2012
Naturalidade: Paço de Sousa (Penafiel)
Habilitações Académicas: Mestrado Integrado em Teologia pela Universidade Católica Portuguesa
(a fazer a Especialização em Teologia Pastoral na Pontifícia Universidade Lateranense – Roma)

As perguntas: 

Padre Sérgio, que recordações guarda do seu tempo como pároco na freguesia de Arrifana? 

Fui pároco da Paróquia de Nossa Senhora da Assunção de Arrifana do dia 8 de Setembro de 2013 a 15 de Agosto de 2016. Guardo no meu coração as mais belas recordações destes anos em que vivi e servi a paróquia de Arrifana. Quando entrei na paróquia, disse na primeira Eucaristia que celebrei que vinha para conhecer, amar e servir. Na verdade, são estas as grandes recordações que guardo. Guardo no meu coração a alegria de conhecer pessoas fantásticas, que me ensinaram a amar e a servir. Com as minhas limitações e fragilidades, sei que ficou muita coisa por fazer, mas guardo no meu coração a alegria contagiante das crianças, adolescentes e jovens da catequese. Guardo no meu coração a força e a luta das famílias que foram para mim um testemunho de fidelidade e serviço à Igreja e ao Mundo. Guardo no meu coração a ternura e o carinho dos idosos e doentes que me faziam sentir um filho amado e acariciado pelas suas palavras e orações. Guardo no meu coração tantos rostos, nomes, gestos e palavras que ao longo desse tempo foram sinal da beleza que é ser cristão, caminhar em Igreja e encontrar em Jesus Cristo Aquele que dá sentido à nossa vida.

Como surgiu esta oportunidade de estudar em Roma e em que consistem os estudos que está a realizar? 

Eu estou a estudar Teologia Pastoral em Roma a pedido do nosso saudoso bispo D. António Francisco dos Santos. No dia da nossa ordenação, colocamo-nos ao serviço da Igreja, onde a Igreja nos quiser e precisar de nós. Por isso, tendo o Sr. D. António, nosso bispo, entendido que precisava de mim nesta missão, respondi-lhe sim e procuro servir a Igreja neste momento, nesta missão de estudos e de enriquecimento para depois melhor poder servir a Igreja. A especialização que fui enviado a fazer é de Teologia Pastoral com especialização em Pastoral Catequética. Nesta primeira fase, estou a estudar a Teologia Pastoral que é a ciência teológica que estuda e projecta a acção da Igreja na sua relação com o mundo e na proximidade com as pessoas. Neste curso abordamos áreas como a Diocese, a Paróquia, a Nova Evangelização, a Pastoral Familiar, a Pastoral Juvenil entre tantas outras áreas. Numa fase posterior, desenvolverei uma especialização com vista ao grau de doutoramento na área da Catequese.

De que forma podem estes estudos integrar-se e contribuir para a melhoria da estrutura da Igreja. Que aptidões lhe trarão e qual será a sua função no futuro? Vão mudar alguma coisa para si?

Quando o Sr. D. António Francisco dos Santos me enviou para Roma e me pediu que fosse desenvolver os meus estudos pediu-me que estudasse a Teologia Pastoral para ajudar na renovação pastoral da diocese, pensando como hoje, no nosso tempo podemos dar uma resposta mais eficaz, mais consciente da realidade hodierna e mais capaz de corresponder com as necessidades dos homens e mulheres de hoje. Por isso, nesta primeira fase os meus estudos centram-se nas várias áreas da pastoral diocesana, as paróquias, os secretariados diocesanos, onde a Paróquia surge como um lugar privilegiado de acção pastoral. Numa segunda fase, o Sr. D. António entendia que os meus estudos deveriam aprofundar a pastoral catequética tendo em conta que é uma área prioritária hoje. Espero que os meus estudos sejam um contributo para esta renovação pastoral e espero estar à altura daquilo que me pedem. Quanto ao futuro, ele está sempre nas mãos de Deus e isto é um motivo para viver animado, com confiança e esperança. Contudo, neste momento esperamos um novo bispo diocesano e devemos aguardar quais os projectos e expectativas que ele traz consigo. Para mim, mantenho a minha disponibilidade para servir a Igreja onde o bispo precisar de mim, quer seja no trabalho paroquial, quer seja em tantos outros serviços onde somos chamados a colaborar e a servir numa diocese. Não sei o que me espera, mas sei que será bom porque está entregue ao desígnio amoroso de Deus.

Numa altura em que os jovens parecem cada vez mais distantes da religião, o que pensa ser necessário fazer para inverter esta tendência? 

Em primeiro lugar, devo dizer que sinto que muitos jovens estão ainda próximos da Igreja e a fazer caminho com a Igreja e para isso basta pensar nas actividades como as Jornadas Mundiais da Juventude ou outras actividades directamente preparadas para eles. Contudo, são muitos os jovens que ainda estão longe da Igreja. Sinto que os jovens continuam a interrogar-se pelo sentido da vida, pela transcendência, pela fé e no mais íntimo dos seus corações reside este desejo de sentido e plenitude. O desafio da Igreja neste momento é fazer os jovens descobrir a beleza da fé, descobrir que seguir Jesus é encontrar Alguém que nos chama a ser felizes e nos convida a viver o amor. A Igreja tem de levar aos jovens a certeza que o Evangelho e Jesus Cristo tem que ver com as suas vidas e as quer tornar melhores e mais felizes.

A Bíblia é um dos livros, senão mesmo o livro mais complexo que existe. E é o centro da religião católica. Concorda que as sessões de catequese abordam a Bíblia de forma muito superficial? Não acha que um estudo mais aprofundado e mais centrado na Bíblia traria mais benefícios quer para os jovens que frequentam a catequese quer para a religião no seu todo? 

A Bíblia mais do que um livro é um conjunto de livros que narra a beleza da fé e a experiência de um Deus que se revela, que se dá a conhecer através da Palavra que nos dirige. Gosto muito de uma frase de um texto do Concílio Vaticano II que afirma que na Bíblia «Deus fala aos homens como amigos». A Bíblia é esse lugar privilegiado onde Deus nos fala e por isso, deve ter um lugar central na vida da Igreja e na sua acção de evangelização, tal como é a catequese. Não se pode falar de Jesus e anunciar o Seu Evangelho sem um contacto directo com a Bíblia. Por isso, a leitura da Palavra de Deus e o aprofundamento dos conhecimentos bíblicos trará sempre muitos benefícios para a missão da Igreja. Hoje são muitos os estudos e estudiosos que nos permitem compreender mais e melhor na riqueza que a Bíblia nos oferece. Recordo que neste momento, temos também em Roma um padre da nossa diocese a estudar Bíblia para que nos possa ajudar mais e melhor nesta área. Na Bíblia, Deus fala-nos e aponta-nos o caminho a seguir, por isso, a Bíblia afirma que a Palavra de Deus é farol que ilumina os nossos passos.

Como vê o futuro da religião? E como pensa que se poderia melhorar a acção da igreja ao nível das paróquias? 

A religião é algo inerente à experiência humana e desde as mais remotas e antigas civilizações estava presente esta dimensão religiosa. Por isso, o homem e a mulher de cada tempo tem necessidade de satisfazer esta sede de transcendência e esta necessidade de dar resposta às questões limite do sentido da nossa existência. Basta pensar que apesar de hoje afirmarmos a crise das religiões instituídas, há uma maior procura das correntes de espiritualidade orientais ou outras formas de religiosidade. Por isso, esta dimensão religiosa estará sempre presente. Contudo, importa fazer o caminho do homem religioso ao homem crente e que descobre a beleza da fé cristã, na alegria de caminhar na Igreja e em Igreja. Ao nível paroquial e local importa acolher aquele que tem sido o desafio do Papa Francisco: mais do que uma pastoral de manutenção é urgente uma conversão pastoral em chave missionária, isto é, que nos coloca como Igreja de portas abertas, que acolhe a todos, que caminha com todos, que não deixa ninguém de fora e que a cada um apresenta a radicalidade e a exigência da alegria de seguir Jesus Cristo.

Diga uma citação\passagem da Bíblia que considere relevante e porquê? 

São muitos os textos e passagens bíblicas que me marcam ao longo do meu percurso. Contudo, quando penso na minha vida e na minha missão ecoa sempre no meu coração as palavras de S. Paulo (2 Cor 4,7): «Trazemos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que se veja que este extraordinário poder é de Deus e não é nosso». Esta foi a frase que escolhi como lema na minha ordenação e que acompanha todo o meu percurso. Sinto muito próximas estas palavras quando penso que Deus me escolheu e depositou em minhas mãos a Sua mensagem e o Seu amor como um precioso tesouro, mas sei que não passo de frágil barro, que tenho limites e fragilidades, que nem sempre consigo viver na minha vida a grandeza e a profundidade do mistério de amor que Deus coloca em minhas mãos. Sou pobre e frágil barro, onde se deposita o tesouro do amor de Deus, mas sou um barro, amado, perdoado e amparado pelo amor de Jesus. Esta passagem pode ser também preciosa na actual situação de missão em que nos encontramos, onde a Igreja se situa como Mãe frágil e vulnerável mas que transporta consigo a força do amor e da ternura de Deus que tem um coração imenso onde todos têm lugar.

Gostaria de deixar algumas palavras para os/as catequistas actualmente em funções e para os jovens que frequentam a catequese?

Aos catequistas quero dirigir-lhes uma palavra de agradecimento, alento e esperança. Os catequistas são um precioso tesouro da Igreja pois dão do seu tempo e disponibilizam as suas vidas para um trabalho que é tão importante na vida da cristã. No meio de uma sociedade, onde todos temos tantas coisas para fazer os catequistas dão gratuita e generosamente do seu tempo para levarem aos mais novos a alegria de ser cristão. Por isso, dirijo-lhes uma palavra de agradecimento. Quero também dar-lhes uma palavra de esperança, pois ainda que tantas vezes não vejam de modo imediato os frutos do seu trabalho, há razões para a esperança, pois o trabalho do catequista é como o trabalho do semeador: a sua missão é semear nos corações daqueles que lhes estão confiados e rezar para que o Espírito Santo faça germinar essa semente no coração das crianças, adolescentes e jovens. Para isso, devem também empenhar-se em formar-se e aprofundar os seus conhecimentos para que possam estar cada vez mais à altura dos desafios do nosso tempo.

Às crianças, adolescentes e jovens da catequese quero apenas recordar-lhes aquilo que tantas vezes lhes disse quando era pároco: o Deus do amor criou-nos para nos amarmos e sermos felizes e experimentarmos uma felicidade que tem sabor de eternidade e que nos projecta para o Céu. Por isso, abri o vosso coração a Jesus. Não tenhais medo! Conhecei mais e melhor Jesus! Encontrai-vos com Ele, pela oração, pela leitura da Bíblia, na comunidade cristã. A Igreja, nascida do Coração de Deus, ainda que tantas vezes, com os seus defeitos e limitações humanas, quer ser a Casa do Amor onde cada homem e cada mulher pode conhecer um Deus que tem um coração onde todos têm um lugar e que por isso, nos acolhe a todos para nos fazer experimentar a verdadeira felicidade. Conhecei Jesus e deixai-vos fascinar pelo Seu amor. Abraçai o projecto de amor que Jesus tem para cada um de vós e leva a todos a felicidade de O seguir.

Para finalizar, tenho que lhe fazer a pergunta que provavelmente estará na cabeça de quem consigo teve o prazer de conviver durante a sua passagem pela freguesia de Arrifana. Pensa que no seu futuro estará um eventual regresso a esta freguesia? 

Como disse numa das perguntas anteriores, fui enviado para Roma pelo meu bispo e estarei sempre onde o meu bispo me quiser e a Igreja precisar de mim. É esta a nossa missão como padres diocesanos: estar onde Deus quer e a Igreja nos pede por intermédio do nosso bispo. Por isso, o meu futuro está nas mãos de Deus e estarei disponível para ir onde Deus me enviar porque sei que aí serei feliz e poderei ajudar os outros a encontrar em Jesus a alegria do seu amor e da sua ternura.

 Mário Pereira

 

4 comentários em “Entrevista: Padre Sérgio Leal

  1. Palavras sábias, e com muito Amor ao chamamento de Deus!!! Bem haja,; e obrigada pela mensagem aos catequistas, pois de facto estas palavras são como um alento ao nosso trabalho!!! Que Deus envie bênçãos, sobre o Padre Sergio!!!

    Curtido por 2 pessoas

    1. Obrigado por ter lido a entrevista e pelo seu interesse!

      Esta entrevista não foi aceite pelo jornal Correio da Feira para publicação, mas como achei que tinha interesse social pelo menos a nível de freguesia e mesmo do concelho tentei encontrar uma alternativa para divulgar as palavras do Padre Sérgio Leal, até porque além da admiração que tenho por ele ele foi muito amável em disponibilizar-me do seu tempo para colaborar nesta pequena entrevista.

      Se me permite o pedido peço apenas a sua ajuda em divulgar esta entrevista, para que o tempo e as palavras que o Padre Sérgio disponibilizou não sejam em vão.

      Muito Obrigado D. Fernanda Oliveira e espero que continue a acompanhar o blog!

      Melhores Cumprimentos;
      Mário Pereira

      Curtido por 1 pessoa

      1. Fez muito bem aproveitar este meio para divulgar, TB. Não entendo o jornal não aceitar…. Serão ateus??? Ou é descriminação???…

        Curtido por 1 pessoa

  2. D. Fernanda Oliveira as razões que o jornal me apresentou foram “Exorbita a escala de enquadramento na temática do Jornal” e “Por razões de ordem deontológica, no Correio da Feira as Entrevistas que publicamos são da exclusiva responsabilidade da Redacção”…sugeriram-me que transformasse a entrevista num texto corrido para a coluna que escrevo no jornal…mas tendo em conta que o espaço que me cedem para essa coluna é relativamente curto a maioria do conteúdo da entrevista acabaria por se perder. E no fim de contas já não seriam as palavras directas do Padre Sérgio mas sim uma interpretação que eu fizesse delas…o que não é a mesma coisa.

    Mas fico muito satizfeito pelo facto de ter conseguido que esta pequena entrevista chegasse ao conhecimento de pessoas como a D. Fernanda.

    Muito obrigado pelos seus comentários!

    Melhores Cumprimentos;
    Mário Pereira

    Curtir

Deixe um comentário